domingo, 27 de outubro de 2013

As pistas, as rotinas e o sono!

Como mãe, a minha perspectiva do desenvolvimento ganha outra forma. Não que antes fosse imaginada porque assisti ao crescimento de muitos bebés, pacientes e familiares, mas porque simplesmente a afectividade que lhe é inerente permite que cada passo seja visualizado com o zoom da alegria e felicidade que é viver o desenvolvimento dos nossos bebés.

Penso que se todos os pais tivessem a informação e formação que tenho seriam muito mais tranquilos quanto ao desenvolvimento dos seus bebés. A variabilidade individual, na universalidade do neurodesenvolvimento, é imensa e aquilo que poderá surgir aos 3 meses num bebé pode surgir noutro aos 2 ou aos 4 meses. Sermos rígidos e aguardarmos pelos marcos de desenvolvimento com a check list à espera de um visto, para além de traduzir a ansiedade que passamos ao bebé, é também sinal da necessidade de repensar as nossas expectativas e mais uma vez adaptarmos a imagem idealizada do bebé para a do real com quem vivemos diariamente.

No nosso caso, foi na semana que completaria os 4 meses que se abriu uma janela de oportunidade, e das valiosas. A das rotinas de sono. E percebendo eu rapidamente as pistas, aproveitei-as como se fossem pedras preciosas. E são! Ditam o primeiro passo da autonomia dos bebés. Numa destas noites a minha filha chorava enquanto a tentava adormecer ao colo, por volta das oito e meia da noite. Estranhei, este já era um hábito estabelecido, entrar no quarto escurecido era suficiente para que o sono ditasse o adormecimento. Confesso que antes de a deitar no berço pensei duas ou três vezes, “será?” No momento que a deitei ficou tranquila, a olhar as imagens que colei no berço e o ursinho que muda de cor e funciona também como luz de presença. Percebendo que era isso que ansiava, sussurrei-lhe “até amanhã, bons sonhos!” Beijei-a, sorriu, nela percebi um olhar de cumplicidade, “percebeste o que eu queria!” Precisava daquele tempo só dela, de fazer um balanço sereno e tranquilo das aprendizagens do dia e perder-se nos contornos dos desenhos e do brilho da luz que a embalaria nos seus primeiros sonhos conduzidos sozinha. Desde então este ritual tem-se mantido e generalizado ao restante sono.

Muitos bebés podem ter esta rotina desde o primeiro dia, depende, cada bebé tem necessidades diferentes. A minha foi aos quatro meses… poderá ser tarde aos olhos de muitos pediatras ou psicólogos. Mas a verdade é que foi no seu tempo, com as pistas ideais para que a compreendesse. Sabia que era uma questão de tempo até que estes pequenos sinais surgissem. O problema surge quando os pais não estão disponíveis para as perceber ou simplesmente não estão suficientemente atentos.

Passa a oportunidade e é certo que o caminho escolhido sendo o errado ditará que mais tarde aquela família terá de arregaçar as mangas e tratar do assunto. Não é desejável que uma criança aos três anos de idade durma na cama dos pais ou precise da presença de um cuidador para que consiga adormecer. Será uma criança mais ansiosa, menos disponível para as aprendizagens e muito dependente do adulto.

Nem oito, nem oitenta. Mas o que mais assisto na minha prática clínica é o oitenta. Crianças de 11 anos que não são minimamente autónomas, extremamente ansiosas que vivem num estado de alerta constante e que realmente sofrem. Elas e os pais, que no entretanto, deixaram de ter também eles uma rotina de sono, este deixou de ser reparador e tranquilo. As rotinas de sono são valiosíssimas, não nos devemos enganar. Ditam a serenidade das noites futuras. Quando exijo aos pais que mudem, que estipulem novas e saudáveis rotinas de sono encontro sempre imensas resistências. Percebo que serão sempre mudanças que causam desconforto, desorganizam a dinâmica em casa mas são tão necessárias como o antibiótico receitado pelo médico.


Não me canso de sublinhar: os bebés dão sempre pistas, comunicam sempre o desconforto pelo choro, mãos fechadas, expressão tensa e respiração ofegante e o conforto pela tranquilidade da sua postura, mãos abertas, respiração pausada e expressão relaxada. Estão em constante relação e por isso, sempre disponíveis para comunicar. Cabe ao adulto ter disponibilidade e vontade de explorar essa interacção.

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