Como mãe, a minha perspectiva do
desenvolvimento ganha outra forma. Não que antes fosse imaginada porque assisti ao crescimento de muitos bebés, pacientes e familiares, mas porque simplesmente a
afectividade que lhe é inerente permite que cada passo seja visualizado com o
zoom da alegria e felicidade que é viver o desenvolvimento dos nossos bebés.
Penso que se todos os pais
tivessem a informação e formação que tenho seriam muito mais tranquilos quanto
ao desenvolvimento dos seus bebés. A variabilidade individual, na universalidade do neurodesenvolvimento, é imensa e aquilo
que poderá surgir aos 3 meses num bebé pode surgir noutro aos 2 ou aos 4 meses.
Sermos rígidos e aguardarmos pelos marcos de desenvolvimento com a check list à
espera de um visto, para além de traduzir a ansiedade que passamos ao bebé, é também
sinal da necessidade de repensar as nossas expectativas e mais uma vez
adaptarmos a imagem idealizada do bebé para a do real com quem vivemos
diariamente.
No nosso caso, foi na semana que
completaria os 4 meses que se abriu uma janela de oportunidade, e das valiosas.
A das rotinas de sono. E percebendo eu rapidamente as pistas, aproveitei-as como
se fossem pedras preciosas. E são! Ditam o primeiro passo da autonomia dos
bebés. Numa destas noites a minha filha chorava enquanto a tentava adormecer ao
colo, por volta das oito e meia da noite. Estranhei, este já era um hábito
estabelecido, entrar no quarto escurecido era suficiente para que o sono
ditasse o adormecimento. Confesso que antes de a deitar no berço pensei duas ou
três vezes, “será?” No momento que a deitei ficou tranquila, a olhar as imagens
que colei no berço e o ursinho que muda de cor e funciona também como luz de
presença. Percebendo que era isso que ansiava, sussurrei-lhe “até amanhã, bons
sonhos!” Beijei-a, sorriu, nela percebi um olhar de cumplicidade, “percebeste o
que eu queria!” Precisava daquele tempo só dela, de fazer um balanço sereno e
tranquilo das aprendizagens do dia e perder-se nos contornos dos desenhos e do
brilho da luz que a embalaria nos seus primeiros sonhos conduzidos sozinha.
Desde então este ritual tem-se mantido e generalizado ao restante sono.
Muitos bebés podem ter esta
rotina desde o primeiro dia, depende, cada bebé tem necessidades diferentes. A
minha foi aos quatro meses… poderá ser tarde aos olhos de muitos pediatras ou
psicólogos. Mas a verdade é que foi no seu tempo, com as pistas ideais para que
a compreendesse. Sabia que era uma questão de tempo até que estes pequenos sinais
surgissem. O problema surge quando os pais não estão disponíveis para as
perceber ou simplesmente não estão suficientemente atentos.
Passa a oportunidade e é certo
que o caminho escolhido sendo o errado ditará que mais tarde aquela família
terá de arregaçar as mangas e tratar do assunto. Não é desejável que uma
criança aos três anos de idade durma na cama dos pais ou precise da presença de
um cuidador para que consiga adormecer. Será uma criança mais ansiosa, menos
disponível para as aprendizagens e muito dependente do adulto.
Nem oito, nem oitenta. Mas o que
mais assisto na minha prática clínica é o oitenta. Crianças de 11 anos que não
são minimamente autónomas, extremamente ansiosas que vivem num estado de alerta
constante e que realmente sofrem. Elas e os pais, que no entretanto, deixaram
de ter também eles uma rotina de sono, este deixou de ser reparador e
tranquilo. As rotinas de sono são valiosíssimas, não nos devemos enganar. Ditam
a serenidade das noites futuras. Quando exijo aos pais que mudem, que estipulem
novas e saudáveis rotinas de sono encontro sempre imensas resistências. Percebo
que serão sempre mudanças que causam desconforto, desorganizam a dinâmica em
casa mas são tão necessárias como o antibiótico receitado pelo médico.
Não me canso de sublinhar: os
bebés dão sempre pistas, comunicam sempre o desconforto pelo choro, mãos fechadas,
expressão tensa e respiração ofegante e o conforto pela tranquilidade da sua
postura, mãos abertas, respiração pausada e expressão relaxada. Estão em
constante relação e por isso, sempre disponíveis para comunicar. Cabe ao adulto
ter disponibilidade e vontade de explorar essa interacção.
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